domingo, 1 de janeiro de 2012

Uma crônica: Natal é sempre Natal


Observações: esse texto eu não escrevi, mas achei tão lindo e mágico que decidi posta-lo.
Para ler no blog original clique aqui.


"A árvore estava finalmente montada. Levara uma tarde inteira para montá-la e enfeitá-la. Estava com alguns arranhões nos braços por tê-la montado sozinha. Mas valera a pena. As pequenas bolas vermelhas e douradas meio descascadas balançavam levemente com o vento. As luzes amarelas piscavam vagarosamente no fim da tarde. Os outros enfeites estavam ainda mais desgastados, pingentes em forma de flocos de neve, onde o Feliz Natal do meio, antes dourado, agora eram apenas manchas de amarelo. Os outros enfeites eram bem improvisados: clipes meio enferrujados em formato de presentinhos, pedaços vermelhos da lata de Coca-Cola cortados em forma de capuzes de papai Noel (esses haviam dado trabalho). A estrela prateada no topo era a única que se mostrava bem-preservada.
 Ela pôde então, colocar finalmente, sua pequena caixinha de presente debaixo da árvore. Esperava que Mikey a obedecesse e não derrubasse a árvore.
 Assobiou, e em um instante o cachorro estava à seu lado, o pelo encardido pela fuligem do quintal. Ele havia ajudado a montar a enfeitar a árvore, no começo, mas depois resolveu ir brincar de assustar os passarinhos.
 Mikey farejou os pedaços de enfeites velhos no chão, pegou uma bolinha que já era totalmente sem tinta e deu na mão de Lucy. Ela sorriu e afagou o seu pescoço. "Obrigada, Mik. Hora do banho, você não pode ficar com esse pelo sujo na noite de Natal." Mikey correu para fora, querendo sair, mas não tinham tempo. Iriam ver os fogos à meia-noite, mas ainda eram 17:00 h, ela precisava preparar alguma coisa para sua pequena ceia, para ela e para quem aparecesse. Lucy desconfiava de queninguém ia aparecer, mas nunca se sabe. Além disso, tinha Mik, ele amava qualquer coisa que lhe dessem para comer, com excessão de abacaxi e comida chinesa. Lucy ainda não o entendia nesse aspecto.
 Encheu uma bacia grande com água e pegou os shampoos de Mikey. Demorou uma hora, como sempre, para dar-lhe banho, terminando com a menina ensopada e com olhos ardendo, e poças de água espalhadas pelo quintal inteiro, mas Mikey estava com o pelo branco novamente. Lucy secou-o o máximo que pôde com o velho secador de cabelo e deixou-o na sala, dizendo antes de tomar seu próprio banho: "nada de mexer na árvore ou de ir pro quintal, senão não sairemos para ver os fogos". Recebeu uma lambida no rosto como resposta, então levantou-se e foi para o banheiro.
 Depois de tomar um banho e colocar um vestido amarelo de verão, encontrou Mikey do modo como o havia deixado, assistindo TV. Lucy sempre deixava no canal dos desenhos animados. Sorriu, coçou-o atrás das orelhas e foi para a cozinha.
 Assou um peru, fez uma farofa e arroz com uvas passas. De sobremesa, fez um pudim e gelatina de morango.
 Quando deu por si, já eram 20:00 horas. Ficou surpresa por Mik ter ficado quieto por aquele tempo todo. Foi encontrá-lo na sala, dormindo ao lado da árvore de Natal. Lucy sorriu e foi arrumar-se.
 Arrumou o cabelo (o que não era exatamente um desafio para ela, já que tinha os cabelos negros e escorridos da mãe, cujo único prejúizo eram os nós depois de uma longa noite de sono), preparou um vestido vermelho escuro que havia usado em sua formatura... puxa, já fazia um ano. Agora estava no Ensino Médio, e dali a dois meses faria 16 anos. Havia se mudado para aquela casa à 2 horas da mãe, padrasto e meios-irmãos. Se sentia bem apenas com Mikey, sem ter de ser culpada por John e Alice, os meios-irmãos mimados e insuportáveis que eram sempre apoiados pelo pai. Sentia falta da mãe, sempre boa com todos os filhos, apesar de trabalhar o dia todo. Lucy sempre cuidara dos irmãos enquanto estava fora, a mãe era o único motivo por não ter fugido de casa com Mikey. Encontrara Mikeu na rua com 12 anos de idade, remexendo o lixo. Quando o viu, soube imediatamente que era seu. Cuidou dele por dois dias antes que os pais descobrissem. Mas Mikey não se separara dela, e nem ela dele. Naquela época podia pegá-lo no colo como um bebê, já agora, ele era quase do seu tamanho quando se punha em pé com duas patas.
  Lucy o amava mais do que aos dois meios-irmãos mais o padrasto juntos. Ele a entendia, e ela o entendia de um modo no início incompreensível. Era seu amigo para todas as horas, que nunca a abandonava e a protegia como ninguém. Dera o nome de Mikey a ele em homenagem ao hamster que tivera com 4 anos. Não a superara ainda até encontrar o caõzinho.
 Mikey (o cachorro) não era parecido com um hamster, mas ele nunca aceitou outro nome. Seu pelo era branco como as nuvens depois de um banho (com excessão do focinho, que tinha uma linha preta), mas geralmente era cinzento ou bege de sujeira. Por isso Lucy o chamava de Tempestade, Chuvoso, Poeirinha ou Abacaxi (ele odiava o último, começava a fazer bagunça e choramingar). Mas Lucy geralmente chamava-o de Mik, ou Mikey, quando estava sendo especialmente carinhosa. Quando estava zangada, chamavá-o de Mikey Donald d'Inverno, e isso acabava deixando-a calma, já que sempre ria do nome que inventara.
 Mikey tinha olhos negros quase humanos, que apesar de escuros como a noite, tinham neles sempre um brilho, como um pedaço da Lua.
 Voltou até a sala e perguntou a Mik, que acordara e ligara a TV outra vez, como estava. "Estou bonita, Mikey?". Deu uma volta com o vestido e sorriu. Por um momento, pareceu-lhe que ele havia sorrido. Viu em seus olhos que estava linda. De algum modo, ela o entendia apenas pelos olhos. Beijou-o entre os olhos e disse "Obrigada, Mik. Você também está lindo assim. Mas.. tenho uma surpresa para você. Venha." Correu ao quarto e escondeu a surpresa atrás de si. Mikey rodeou-a "Quieto... espero que goste do presente. Feliz Natal querido". Então mostrou-lhe finalmente. Custou a vesti-lo com o novo smooking. Parecia o cachorro de um lorde, com o smooking preto e branco de botões e gola e lencinho vermelho no bolso do peito. Lucy riu enquanto Mik latia e farejava. "Você está bonito, Mik. Mas fique calmo, você ganhará outro presente à meia-noite. O cachorro parou e sentou-se, comportado, olhando-a com os grandes olhos negros. "Não, não vou dizer o que é. Tenha paciência".
Ouviram alguém bater palmas no portão, e Mikey correu imeditamente para lá. "Mikey, espera." Quem seria? Talvez os pais houvessem resolvido vir.
 "Quem é?" perguntou, sem obter resposta. Mikey arranhava o rústico portão de madeira. "Quem é?", perguntou outra vez, outra vez em vão. Olhou pela fresta da lateral e viu um garoto da idade dela, de cabelos encaracolados castanhos. Lucy sorriu e abriu o portão. "Bu!" gritou Leo, mas quem se assustou foi ele, pois Mikey pulou em cima dele, quase fazendo-o cair.
 "Mikey, quieto! Sai, sai.", repreendeu Lucy, fazendo os dois entrarem.
 "Desculpe-me, Leo, ninguém mandou tentar me assustar." Ela riu, mas quando se virou, Leo piscava, perplexo. "O que é?", perguntou Lucy.
 "N-nada, é que... você está linda, quer dizer, esse vestido fica lindo em você." Ele abaixou os olhos para a tigela que segurava.
 Lucy sorriu. Ele também estava bonito, com o terno marrom por cima da camisa branca, e os tênis de sempre. Era estranho vê-lo tão formal, já que todos os dias via-o de camiseta e shorts na escola.
 "Você, também, Leo, obrigada. Hã... o que é isso?", perguntou-lhe, apontando para a tigela.
 "Um... pote?" respondeu ele.
 "Oh, não me diga. O que tem dentro do pote?".
 "Chocolate. Bombons e biscoitos de natal".
 "Você quem fez?" perguntou, desconfiada. Leo morava sozinho em um apartamento com os avós, mas haviam viajado, e Leo não sabia cozinhar, que soubesse.
 Ele riu. "Não, comprei. Não faço a mínima ideia de como fazer biscoitos, quanto mais biscoitos com formatos diferentes."
 Lucy acompanhou-o para dentro de casa, e colocou os biscoitos dele junto às outras coisas que havia preparado.
 "Bom, ainda temos duas horas até meia-noite, então podemos conversar."
 Conversar não era fácil com Mikey pulando entre eles tentando roubar a atenção e fazendo de tudo para tirar o smoking. Lucy sabia o motivo da impaciêcia. Mik estava com ciúmes, é claro. Não que não tivesse motivos para isso. Leo era apaixonado por ela, isso se via apenas de olhar para ele. Lucy... não sabia o que sentia. Ele era tão bom... mas, depois da última pessoa por que havia se apaixonado, seu coração havia criado uma barreira contra o amor. O último havia quebrado seu coração em pedaços e pisado neles, tudo culpa sua. Fora tão idiota. Já fazia dois anos, devia ter esquecido. E esquecera, mas não se sentia segura para amar alguém de novo. Mas Leo...
 Conversaram o melhor possível sobre seus planos para o futuro e sobre como achavam que seria o próximo ano letivo. Conversaram sobre cães, sobre filmes, e sobre livros. Conversaram sobre eles mesmos. Pobre Leo, perdera o pai e mãe em um acidente de carro quando tinha 3 anos. Os avós cuidavam dele desde então. Viviam em um apartamento apertado, e Leo não tinha muitos amigos, por ser muito tímido. Ele e Lucy haviam se conhecido por meio da irmã dele, que era escritora, e Lucy admirava-a muito. Vira os dois juntos uma vez e pediu um autógrafo dela. Assim Leo e ela acabaram virando melhores amigos no primeiro mês de Ensino Médio.
 Quando deram por si, faltavam dez minutos para a meia-noite. "Oh, meu Deus, preciso arrumar a mesa!".
 Leo ajudou-a, e então faltavam apenas três minutos.
 "Venha, Mik, vamos ver os fogos, está quase na hora!". O cão apareceu na mesma hora, e juntos, os três sairam para a rua.
 Logo, deu meia-noite, e os fogos coloridos e barulhentos começaram a subir. Mikey começou a uivar. Lucy abraçou-o, beijou-o e desejou feliz Natal ao cachorrinho mais especial do mundo. Então abraçou Leo, e seu coração disparou, desejando feliz Natal. Ele disse o mesmo, e os fogos se extinguiram.
 Outra vez em casa, Mikey estava satisfeito e inquieto. Sabia que era hora do presente.
 Lucy pegou a pequena caixinha debaixo da árvore e Mik sentou-se. Ela abraçou-o de novo, ajoelhou-se ao lado dele e desfez o laço. Pegou a coleira de couro preto com plaquinha prateada onde se lia Mikey e colocou nele. Temeu que ele não gostasse, mas ele a lambeu e passou a caminhar pela casa como um rei. Meu pequeno rei, pensou Lucy.
 Então ela foi ao quarto e entregou o presente que havia comprado para Leo. Nunca tivera certeza se viria, mas comprara mesmo assim uma caneta com o nome dele gravado e um livro com que ele andara sonhando.
 "Puxa, obrigado, Lucy. Eu adorei. Agora o seu presente."
 Ele lhe entregou alguns papéis. "É o novo livro da minha irmã, que só será lançado na metade do ano que vem. Ela fez uma cópia e deixou que eu desse pra você. Sei como... você estava ansiosa. Ela mandou um feliz Natal".
 Lucy simplesmente ficou tão louca de alegria que beijou-o no rosto e agradeceu. Ele ficou todo vermelho, mas o telefone tocou, salvando-a do constrangimento.
 Depois de desejar um Feliz Natal para os pais no telefone, Mikey lhe entregou um pedaço de papel rabiscado, com a marca de uma para e uma tentativa de desenho de uma caixa embrulhada com o lápis preto que sumira. "Awn, Mik, obrigada! Eu amei, não sabia que você sabia desenhar. Estou tão orgulhosa!". Ele empertigou-se todo de orgulho.
 Então finalmente foram jantar. Estavam os três mortos de fome, principalmente Mikey, que comeu um quarto do peru, uma tigela de arroz (o que era metade do arroz que Lucy havia feito) e quase todos os biscoitos de Natal de Leo. Pelo menos depois disso Lucy tirou uma foto com os três juntos e uma apenas com ela e ele, e tirou-lhe o smoking. Mik foi dormir embaixo da árvore, e Leo e Lucy subiram ao telhado da casa (Lucy insistiu, já que amava aquele lugar).
 "Se cairmos a culpa é sua", disse Leo.
 "Não vamos cair, seu bobo. Subo aqui sempre, e estou inteira. Além disso, se eu cair, bem... você é o cavalheiro aqui. Tem de me salvar."
 Eles riram e ficaram olhando as estrelas. Ela mostrou-lhe uma constelação. Ele não conseguiu encontrar. Ela ficou de pé no telhado, descalça, e fingiu que tropeçava. Ele disse "Quer me matar do coração?" e fê-la sentar de novo, mais perto dele. Ela sorriu. "Só estava te fazendo provar que iria me pegar se eu caísse."
 "Muito engraçadinha. Não teve graça nenhuma". Disse Leo, irônicamente.
 Um minuto depois ele tirou uma caixinha do bolso.
 "O que é isso?" perguntou Lucy.
 "Uma caixinha?" sugeriu o garoto.
 Ela suspirou. "Muito engraçadinho. O que tem dentro?" revirou os olhos.
 "Cabe a você descobrir, é seu presente". Leo lhe entregou a caixinha.
 Ela abriu, cheia de curiosidade, e um anel sintilou.
 "Oh, que lindo Leo... não precisava, não mesmo. Por que me deu isso?".
 "Porque... " ele pegou o anel e girou-o, para colocá-lo no dedo dela.
 Ela ergueu a mão para deixar colocar o anel, e estava prestes a perguntar de novo, quando viu.
 I Love You
 estava escrito na prata, entre pedrinhas brilhantes. Leu de novo, o anel havia ficado perfeito em seu dedo.
 "Oh, eu..." seus olhos cinza-azulados encontraram os doces olhos castanhos dele.
 Sentiu a barreira em seu coração se quebrar, e disse, pensando no que Mikey acharia daquilo
 "I love you too".
 Se beijaram sob um céu estrelado e sobre todas as famílias e casais que comemoravam o Natal. De fato, o Natal era mágico.
 Até que ouviram o leve rosnado.
 Mikey estava equilibrado no telhado atrás de Leo, com os olhos negros (que pareciam azuis no escuro)  fitando-os com desconfiança.
 "Ah, Mik... venha cá."
 Ele deitou a cabeça no colo dela, e ela murmurou a seu ouvido "Ninguém vai pegar o seu lugar no meu coração, meu (pensou em dizer abacaxizinho, mas mudou de ideia) pequeno Mik. nem mesmo Leo. Ninguém mais será meu heroi".
 Ele fechou os olhos e pareceu adormecer. Leo sorriu e ela encostou a cabeça no ombro dele.
 De manhã, haviam acabado dormindo no telhado, o cachorro no colo da garota, a garota no colo do garoto, e o garoto quase caindo do telhado.
 Quando acordaram, gritaram e riram.
 O Natal estava apenas no começo, mas já havia sido mágico.
 Afinal, estejamos com a família, com o cachorro, com os amigos...
 Natal é sempre Natal."

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